Autor: Editoria de Folclore - Site de Dicas[1]
Revisto e Atualizado: 02 de Maio de 2024
Além de presenciar o descobrimento oficial do Brasil, a Bahia, foi testemunha ocular da fusão inicial da raça em todas suas variedades étnicas. É uma região que deve merecer a maior atenção e cuidados na verificação e colheita de material etnográfico.
Com um volume de escravos muito maior que em todo resto do Brasil, a Bahia tem no africano, como um dos mais legítimos responsáveis pela sua glória. Dessa forma, o negro seria um dominador em qualquer manifestação de espírito coletivo.
Mas, curiosamente, não se encontra essa aparente "amplidão" na influência negra.[2]
Influente principal da religião, dogmas, tradições, protocolos, ávidos pelo sobrenatural, sendo parte importante nas estórias populares, nos contos infantis, nas danças, ritmos e melodias, o negro não o é na parte que se refere aos mitos.
Nenhum ser fabuloso, animal fantástico ou ente amedrontador, é positivamente um documento africano, como o Lobisomem que nos veio da Europa ou o Curupira que nos deu o índio brasileiro.
Depois dos livros de Nina Rodrigues[3], Manuel Querino[4], Edison Carneiro[5]. a religião dos afro-brasileiros baianos está sendo posta sob nova luz e podemos calcular o tamanho de seu alcance na psicologia do mestiço. Mas no mito, na relação de seu processo de presença e finalidade, a influência do Negro, na própria terra baiana é quase nula. Um elemento de prova é o livro "Folclore no Brasil", onde o Sr. Basílio de Magalhães[6] comenta o material fixado pelo Dr. João da Silva Campos. "O contingente negro, entre os mitos pesquisados e coletados, é o menor no volume."
Mas, a maioria dos mitos tem adaptações dos mestiços negros. Escapa o Quibungo, mas este é ignorado pelas populações negras de Minas, Rio, São Paulo, Nordeste e extremo norte do país (Pará), ficando limitado à Bahia, que é sua única área de assombração.
Os coletaneadores de estórias africanas, nada sobre ele falam, tais como Ellis, Chatelain, Callaway e Junod. Uma característica do Quibungo é sua bocarra aberta verticalmente da garganta ao estômago. O mito ameraba Mapinguari surge, em alguns depoimentos, com esta mesma disposição. Quem poderá afirmar que a forma do Mapinguari foi influenciada pelo Quibungo e vice-e-versa?
Na Bahia os mitos de maior divulgação pertencem aos europeus e indígenas. São o Lobisomem, a Mula-sem-Cabeça, o Batatão, Batatá ou Biatatá, as Mães-de-Água, confundidas com os cultos iurubas, o Zumbi que é uma espécie de Curupira ou feiticeiro etc. Os mitos locais e secundários são apenas pedaços de adaptações de outros mitos, oriundos de outras regiões, sem nenhuma autenticidade ou originalidade.
A Editoria de Pesquisas Folclóricas, é composta por dois antropológos, sendo um deles também folclorista, historiador e publicitário. Contamos ainda com a colaboração de uma pedagoga e antropóloga especializada em Tradições Populares e Costumes Antigos, e também com as valorosas contribuições dos nossos leitores.
>>> Bibliografia consultada.
[2] Escreveu o folclorista Luís da Câmara Cascudo: Uma prova dessa predominância enganosa tive pessoalmente. Cansado das leituras que ao negro entregam o domínio mental da nossa psicologia religiosa e popular, dificilmente me fui desenganado entre as positivas demonstrações contrárias. Estudando os feiticeiros e seus processos de macumba (vide Notas sobre o Catimbó, in "Novos Estudos Afro Brasileiros, Bib. de Divulgação científica, Vol. IX, Rio, 1937, p.120) escrevi, convencido, que a "semente" era do negro catimbozeiro.
A "semente" é uma espécie de quisto que o "mestre" possui debaixo da pele da mão ou no lóbulo da orelha. Não há "Mestre" sem a exibição da "semente", dada por outro "Mestre do Além". Registrei então o que sabia na espécie. Dois anos depois, lendo o Teófilo Braga, o ensaísta, escritor e pesquisador etnográfico Português (O Povo Português, Vol.II, p.65) deparei com essa afirmativa insofismável: "... a pedra que se emprega no pacto com o diabo, na feitiçaria do século XVI, ainda se conserva nos costumes de Cabo Verde, na ilha de S. Tiago; dá-se o nome de "Fetal" a uma pedrinha mágica, do tamanho de um grão de mostardeira, que as pessoas que fazem pacto com o diabo recebem no sítio chamado "Água de Marta". A pedrinha é metida debaixo da pele, e aquele que a traz em si, o fetalista, fica para sempre livre de desgraças embora não chegue a ser rico."
A influência africana em Portugal não seria, no século XVI, capaz de determinar essa popularidade.
[3] Raimundo Nina Rodrigues (Vargem Grande, 4 de dezembro de 1862 - Paris, 17 de julho de 1906) foi um médico legista, psiquiatra, professor e antropólogo brasileiro.
[4] Manuel Raimundo Querino (Santo Amaro da Purificação, 28 de julho de 1851 - Salvador, 14 de fevereiro de 1923) foi um intelectual afro-descendente, aluno fundador do Liceu de Artes e Ofícios da Bahia e da Escola de Belas Artes, escritor e pioneiro nos registros antropológicos da cultura africana na Bahia.
[5] Edison de Souza Carneiro (Salvador, 12 de agosto de 1912 - Rio de Janeiro, 2 de dezembro de 1972) foi um escritor brasileiro, especializado em temas afro-brasileiros. Fez todos seus estudos em Salvador, até diplomar-se em Ciências Jurídicas e Sociais pela Faculdade de Direito da Bahia, em 1936 (turma de 1935).
[6] Basílio de Magalhães (São João Del-Rei, 17 de junho de 1874 - Lambari, 14 de dezembro de 1957), foi um historiador, folclorista e professor brasileiro.[1]
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