Autores: Jon Talber e Ester Cartago[1]
Atualizado: 30 de Maio de 2022
Em ambos os casos, cria-se uma inevitável situação de rivalidade entre indivíduos. Na escola será entre os alunos, e em casa com os irmãos ou com os próprios pais. Em ambientes assim, o entendimento entre as pessoas não passa de um mito, uma vez que todos, de algum modo, agora se vêem como adversários.
Por que não deveria ser algo natural a realização de uma tarefa em benefício próprio? Para escovar os dentes é realmente necessário um incentivo ou aliciamento à custa de um agrado ou outra forma de persuasão? Não seria mais inteligente mostrar às crianças, por meio de exemplos claros, o que se ganha ao cumprir com seus deveres, assim como o que se perde por não cumprir?
Como podemos esperar uma sociedade justa se o justo para nós implica necessariamente em receber compensações ou pagamentos em troca que qualquer ato praticado? Nem sempre o dote recebido precisa ser imediato, ou em sua forma material, uma vez que um consolo espiritual também nos serve. A promessa de um prêmio ainda maior, para o futuro, talvez para além da vida, também nos parece algo motivador.
Se a busca por mérito ou destaque pessoal é tudo que importa, imaginar uma sociedade justa e pautada no respeito mútuo nunca passará de um mito. Ao se valorizar o mérito despreza-se o valor de qualquer tarefa não compensatória, a exemplo do assistencialismo gratuito. Nesse caso, leva-se em conta apenas o status da atividade ou a importância do favorecido, uma vez que tudo agora é tratado como simples barganha ou tratado comercial.
Numa sociedade onde a força da lei serve como relho disciplinador, a desordem e insensatez absoluta são seus verdadeiros condutores. Quando precisamos de leis para nos ordenar, é porque ainda não sabemos o que vem a ser o estado de Ordem em nosso dia a dia.
E é dessa desordem que, paradoxalmente, esperamos o surgimento de um movimento capaz de colocar nossas vidas em ordem. Ainda assim, podemos estudar essa desordem e aprender com ela, e depois decidir o que fazer com isso. Uma coisa é certa: a desordem não é capaz de criar ordem. Perceber esse fato irrefutável nos permite ter consciência de que algo precisa ser feito. O sentimento de ordem é capaz de perceber a desordem, embora o inverso não seja possível.
Os erros se prestam a nos ensinar como não devemos agir, e se bem aceitos e compreendidos, o ganho será inevitável. É certo que ninguém deseja errar de maneira intencional, e a despeito dos efeitos e malefícios que poderão nos proporcionar, deles também é possível tirar algum proveito, mas apenas quando estamos dispostos a aceitá-los. Nunca deveriam ser interpretados como punições ou castigos, e sim como um reflexo do estado de imperfeição do qual somos depositários ou portadores, independente de nossa condição social, credo ou raça.
Poderíamos afirmar que um erro é a prévia de um acerto em andamento. Vale aqui excetuar-se os erros deliberados, onde o praticante o faz por deformação moral, de maneira consciente e premeditada. E há os erros não intencionais, aqueles praticados por imaturidade ou inabilidade. Nesse caso, atuam como instrutores, mostrando os caminhos que deverão ser evitados, qualificando assim nossas ações presentes e futuras.
Somos produto de um mundo imperfeito. Não podemos ser perfeitos, e a razão é bastante simples: Um mundo Psicologicamente Imperfeito não é capaz de produzir Homens Psicologicamente Perfeitos.
Ao eleger a recompensa como elemento motivacional para que nosso filho ou aluno cumpra com seus deveres, estamos adotando uma postura patológica, incentivando e reforçando a corrupção. O incentivo, por menor que seja, corrompe o caráter. Cria-se assim o hábito da troca de favores. E não mais existirá a ação solidária, espontânea, nem a cordialidade gratuita; muito menos o respeito, uma vez que para cada ato praticado uma gratificação é esperada. É a consolidação de uma tradição nosográfica descrita até nos livros sagrados, que diz: “É dando que se recebe...”
A falsa Disciplina torna-se então uma obrigação, e a obrigação torna-se um negócio dos mais lucrativos; um meio começo e fim para se obter uma vantagem pessoal e corromper o caráter das pessoas.
Quando não somos capazes de acreditar no potencial dos nossos próprios filhos ou alunos, a Prática da Corrupção será o único meio capaz de induzi-los a uma modelagem forçada. Se o resultado que deles esperamos só é possível por meio do gesto meritório, qual será a qualidade do mundo que irão criar?
Haverá espaço neste futuro mundo para o respeito e a solidariedade, uma condição onde o sentimento de não competição se faça presente? A prática da gratificação consolida o processo competitivo, uma vez que confere ao perdedor demérito e ao vencedor mérito, o que favorece o processo da ambição, inveja e violência.
Explicar, esclarecer e ajudar o filho a compreender quais são as vantagens que obterá para si mesmo a partir daquele ato, este deveria ser nosso papel, ao invés do argumento coercivo. Ao coagi-lo com a promessa de prêmios para que se responsabilize por seus deveres mais básicos, estamos criando um indivíduo que não respeita nem a si mesmo. Se ele não se sente motivado para cumprir algo em beneficio próprio, imagine sua postura em relação aos outros?
Ao aprender a cuidar de si porque compreendeu que é a coisa certa, ele também aprenderá a respeitar o espaço do seu semelhante, valorizando o esforço alheio. Terá mais possibilidade de se integrar ao mundo de maneira pacífica, com um mínimo de conflitos e uma disposição mais assistencial e menos mercantilista.
Nosso papel de orientar e detalhar o que nossos filhos deverão fazer, numa linguagem compreensível e não redundante, e o mais importante, por que estão fazendo, esta é a verdadeira pedagogia. Seus anos de frequência escolar serão nulos se em casa não lhes explicamos com argumentos claros e esclarecedores porque precisam fazer isso ou aquilo. Não acredite que irão descobrir estas coisas por conta própria na rua. Use sua própria experiência de vida como exemplo e tire suas conclusões.
Não podemos deixar isso nas Mãos dos Educadores, eles também não o farão. Precisamos ir além e enumerar, de maneira compreensível e didática, todos os benefícios que poderão colher a partir desse esforço, ou caso contrário, os malefícios, caso desprezem a oportunidade.
Isso é respeito. É o mínimo de um máximo que poderíamos dispensar a todos se houvesse interesse de nossa parte. No entanto, para a maioria de nós, talvez de boa fé o fizéssemos, se tivéssemos a certeza de que ao final, de algum modo, seríamos regiamente recompensados pela autoria, iniciativa ou aplicação desse magistério.