Autor: Anne Marie Lucille[1]
Conteúdo Atualizado: 29 de Novembro de 2023
Daí a idolatria aos grandes ícones ou vultos históricos, antigos ou contemporâneos, que nos compêndios midiáticos ou didáticos são usados como gabaritos, exemplos de coragem, virtude e sucesso. São os antigos e novos heróis que resistem ao tempo, e cuja suposta trajetória de vida servirá como referência para a construção de novas personalidades.
Cada sociedade existente não abre mão dos seus ícones e heróis, mesmo que nunca tenham existido. A ideia é usá-los como “espelhos” ou estereótipos no processo da criação e lapidação de condutas e comportamentos pré-estabelecidos, uma espécie de rédeas padrão para domesticar bárbaros, ou apenas como reforço para instigar e consolidar o sentimento de nacionalismo, culto a alguma ideologia ou obediência cega às tradições.
E assim é ensinado nas salas de aula o culto aos heróis. Eles são capazes de feitos extraordinários, impossíveis quando comparados aos homens comuns, daí o fascínio. E os eventos históricos ou contemporâneos retocados, uma prática comum e recorrente em todas as civilizações, servirão para realçar sua imagem.
É a veneração ao menino pobre capaz de superar obstáculos além da compreensão humana, que se torna poderoso e rico. Um vencedor e salvador dos fracos; um exemplo notável de conduta e virtude, o guia perfeito para os injustiçados e um símbolo digno de veneração; um perfil digno de ser imitado, aclamado ou reverenciado por todos.
Na mente de uma criança a comparação tem um impacto importante. Primeiro ela terá que abrir mão de sua própria personalidade e inclinações naturais para então incorporar os caracteres do “outro”. Além disso, muitas vezes ela sequer possui quaisquer dos atributos que favoreçam a clonagem daquele personagem idealizado pela história ou tradição.
Como Resultado, muitas vezes teremos pela frente um indivúduo assediado pelas frustrações, conflitos, autodesengano e uma exarcebada baixa autoestima, exatamente numa hora de grande vulnerabilidade e carência.
E graças a estes ídolos realçados pelo imaginário de cada um, uma gigantesca e bem estruturada mentalidade condicionadora, apoiada por uma poderosa engrenagem econômica e social, sobrevive, prospera, reforça seu repertório de distrações para uma população sem ideais, cujo objetivo de vida é viver a vida e os sonhos dos outros.
Mergulhados em problemas familiares, obrigações, afazeres domésticos que nunca se esgotam e problemas que se renovam a cada estação, eis o perfil do homem comum. Entretanto, nada disso faz parte da rotina daqueles “homens privilegiados" pela graça de uma contingência quase divina, agraciados com dotes extraordinários, o sonho de cada idólatra. Uma condição sedutora, reforçada todos os dias, criando no imaginário popular uma verdadeira diretriz existencial ou objetivo de vida.
Fazendo uma analogia, é exatamente este o mundo que nossos filhos pequenos conhecem desde cedo, idealizado desde os primeiros passos, graças aos Contos de Fadas obrigatoriamente, desde sempre, inseridos em suas vidas. De fato, destes contos surge a ideia de um paraíso que pode ser tocado, e tudo isso a depender da cota de mérito de cada um.
Se psicologicamente somos um espelho dos estereótipos comuns que integram os costumes sociais do meio que nos condiciona e recondiciona, existem algumas diferenças na estrutura da psique entre os dois gêneros humanos.
A Psique da criança do sexo masculino está predisposto a avaliar as coisas do seu mundo por meio do movimento, noção de espaço e lógica. A criança do sexo feminino mentalmente interage melhor com as emoções, todas as formas de comunicação, com a estética, criatividade, organização, disciplina e discernimento, além de possuir uma qualidade que o gênero masculino praticamente desconhece que é a intuição.
Logo, embora condicionados pela mesma fonte, as assimilações dos estereótipos são absorvidas com diferenças dramáticas. Cada um compreende segundo sua própria capacidade sensorial e qualidade cognitiva. Logo o ideário de uma menina, mesmo que influenciada pela mesma fonte, é quase oposto ao do menino. Os valores sociais ou culturais possuem pesos diferenciados dentro da psique de cada gênero. É importante que saibamos disso desde o princípio.
Para uma criança pequena não existem os gêneros sexuais diferentes. Para ela, menina é aquela que possui cabelo comprido e veste saia, um ponto de vista já tirado dos estereótipos. Mas logo, na sua mente, vão se juntando os elementos que caracterizam bem os costumes e tradições locais, assim como as idiossincrasias naturais e espontâneas, ou ainda os estereótipos artificiais coletados do meio social que se prestam a designar e rotular cada gênero.
Conciliar realização profissional com o sentimento de satisfação na consecução de nossas tarefas parece ser um sonho distante, uma ideia formulada por alguém, quem sabe, um daqueles ídolos do faz de contas. E muitas vezes, as oportunidades escassas e a grande competição por uma mesma oportunidade não nos permite escolher a ocupação dos nossos sonhos. Outras vezes, o acaso acaba por nos colocar diante de tarefas que se revelam como uma verdadeira dádiva vocacional.
Frente a frente com a realidade, logo imaginamos seu oposto. É como funciona qualquer processo de escolha, uma vez que a eleição de alguma coisa representa um ideal que desejamos alcançar. Sendo um aluno medíocre, logo nos comparamos com o melhor da turma, e meu ideal é ser ainda melhor. Só temos olhos para o oposto, e ali focamos nossos objetivos, o que representa uma fuga óbvia à realidade.
E embora não possamos prescindir da escolha, podemos abrir mão dos opostos e optar apenas pela realidade. Diante dos fatos estaremos qualificados a compreender que, não importa qual seja nossa escolha, isso representa um benefício, uma possibilidade de aprendizado e autoexperimentação. E mesmo quando o processo se mostra adverso, não podemos nos esquecer de que, sem os aparentes erros de percurso, não existiriam os definitivos acertos de curso.