Autor: Alberto J. Grimm[1]
Atualizado: 30 de Maio de 2022
Um sábio, depois de estudar durante anos a história de uma civilização perdida, tabulando e confrontando diferentes pontos de vista, decidiu traçar sua própria versão sobre o assunto. E ao concluir a compilação de dados e finalizar o projeto, afirmou para si mesmo: “Juntar retalhos de opiniões distintas a partir de relatos ou supostos acontecimentos, especialmente do passado, para tentar descrever um fato que não conhecemos ou vivenciamos, é o mesmo que tentar descobrir como se chega a um local sem nome, cuja localização ninguém nunca soube, sem uma estética, aparência urbana ou limites geográficos tangíveis, em busca de alguma coisa que para nós é absolutamente desconhecida...”
De fato, posso acreditar enfaticamente em uma mentira e imaginar com isso que estou bem informado. Uma crença não é capaz de tornar real aquilo que é apenas uma ilusão, mito, ritos da tradição, uma alienação individual ou coletiva. Por exemplo, os grandes sábios ou cientistas oficiais da antiguidade acreditavam que a terra, além de plana era o centro do universo, e isso, para eles, significava estar bem informado.
E do mesmo modo que os textos dos livros sagrados para os discípulos, sectários ou congregados de uma seita, doutrina ou ideologia religiosa representam fatos incontestáveis, no mundo real, quer dizer, na sociedade mundana, existem instituições ou autoridades que, diante da opinião pública, possuem um grau de reputação e credibilidade tão acentuado que poderão servir de referência, peso e medida para atestar, corrigir ou negar a veracidade de qualquer notícia, informação ou opinião. Algumas destas autoridades, por força do seu “Pedigree”, são conhecidas como as “Fontes Oficiais”.
Sua palavra tem o mesmo peso de uma sentença proferida por um imparcial tribunal de última instância, da qual não é mais possível recorrer para cientificar, autenticar, certificar ou negar uma questão qualquer. Seu aval serve de prova e palavra final de que aquilo é coisa legítima, genuína ou falsa. E daquele ponto em diante, quase não existe mais espaço para contestações, refutações e elucubrações sobre o assunto, qualquer que seja.
Mas, o que caracteriza uma verdade? Afinal de contas, para um fanático religioso, ativista ideológico radical ou partidário intransigente de alguma crença, cujo condicionamento ou falta de lucidez não o permite contestar seu guia, mestre condutor ou os paradigmas, ditos e não ditos de suas certezas, qualquer mentira tem o mesmo peso, volume e consistência de uma verdade.
Noutro exemplo, para um louco que durante seus delírios psicóticos imagina ser possível cortar um sólido poste de ferro com uma lâmina de barbear, esta ideia, embora seja absurda para um indivíduo personificado como normal, ainda assim, para ele também representa a mais pura e irrefutável verdade.
No primeiro caso, o que conta é a percepção do observador. Se ele for míope, a maneira como enxergará seu mundo será indistinta, difusa, desfocada e distorcida, e ponto final. No segundo, a coisa apresentada não é nem totalmente mentira, nem completamente verdade, está incompleta, mas pode ser transmitida como verdade, e como verdade será recebida, aceita e replicada. No terceiro caso, estamos diante de um fato, onde a opinião, testemunho ou necessidade de confirmação de quem quer que seja é absolutamente dispensável ou desnecessária.
Portanto, no nosso caso, apenas as duas primeiras condições serão levadas em conta, já que são os meios usados pelas fontes já citadas para disseminar a desinformação, desconstrução de fatos, “Fake-News”, retóricas eufemísticas ou mentiras travestidas de verdades.
Mal informado é aquele indivíduo que não sabe o que está acontecendo, seja por falta de interesse, ou porque não tem acesso a informação cientificada. Desinformado é aquele que tem acesso a falsa informação, e apesar de achar que sabe, ignora que não sabe.
Assim, o ato de desinformar, em um mundo onde uma minoria parcialmente informada tem o controle absoluto de tudo aquilo que vai para dentro dos cérebros ou intelectos de uma maioria completamente alheia à realidade, tornou-se uma técnica de guerrilha, e um dos mais eficientes meios de dominação, disseminação de ideais, doutrinas, crenças, delírios patológicos, controle social e alienação coletiva.
Com tanto poder em mãos, este mecanismo social, com as ferramentas que estão sob sua custódia ou tutela, é capaz de transformar um terrorista em santo ou um santo em terrorista quase num piscar de olhos. Usando o mesmo critério, é capaz de transformar algo completamente inútil em uma Necessidade material, Existencial ou Espiritual, pela qual, seus seguidores, séquitos e incondicionais apoiadores estarão dispostos a sacrificar a própria vida para embalar e levar para casa debaixo do braço, pouco importando qual seja o custo, utilidade ou conseqüências.
E partindo sempre do princípio que a falta de lucidez é uma regra entre seu público alvo, os arautos que estão na linha de frente dessa cruzada, descaracterizam fatos e evidências já certificadas pela ciência em nome do idealismo, preceitos doutrinários e crenças, e sempre se posicionando como autoridades de inabalável virtude, ética ilibada, e, como não poderia deixar de ser, autoempossados como salvadores e restauradores da ordem e dos bons costumes.
E assim, de posse da comenda própria da posição hierárquica ou Pedigree do qual desfrutam como influenciadores, formadores de opiniões ou autoridades consolidadas em seu meio, manipulam de acordo com seus interesses tudo que deve entrar ou sair da cabeça dos seus obstinados e passivos adeptos ou simpatizantes, criando alienações coletivas e ilusões difíceis de erradicar ao longo do tempo.
E como funciona o processo de disseminação? Por regra, embora a depender das demandas mais imediatas existam as exceções, os frutos são colhidos de maneira discreta, nunca ostensiva. E ocorre quase sempre de modo lento, feito com paciência e cautela, imperceptível para quem recebe. Mas sempre num ritmo regular, persistente, dia e noite a mesma e discreta ladainha ecoando na cabeça da pobre vítima, e de repente, depois de tantas sugestões subliminares ou diretas, o sujeito é assediado por um desejo incontrolável de comprar, por exemplo, um saco de balas de jujuba, mesmo sem saber o motivo, mesmo que não exista um motivo. E está feito.
E assim, desinformado e alheio à realidade dos fatos, ignorante e sentado diante dos tratados de suas doutrinas ou ideologias, sejam mundanas ou sacras, independente do propósito, com a insígnia do conhecimento em volta do pescoço, não imagina que se tornou, além de um intransigente defensor de distorções sociais, um semeador voluntário de mentiras ou fantasias; ideias que foram habilmente encapadas como verdades. E nem de longe passa pela sua cabeça que, além de ter sido enganado, está sendo usado como instrumento de manipulação coletiva, e o pior de tudo, convicto de que está praticando, de boa fé, uma exemplar, libertadora e edificante ação.